segunda-feira, 21 de março de 2011

A cajuína, cristalina em Teresina

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Saudades de Teresina

      
A cidade mais quente que conheço do Brasil é Teresina. Senti mais calor na capital do Piauí do que em Cuiabá, Corumbá, Manaus, Maceió, Buíque, Buritama... e do que sinto em Ribeirão Preto. Não conheço nem 2% dos 5.565 municípios brasileiros. Não conheço Cordisburgo, Porto Velho, Pilão Arcado, Lobato, Belém, São Raimundo Nonato... e nem Morro Agudo.

Neste último final de semana, quando os termômetros atingiram temperaturas elevadíssimas, percebi que nos momentos mais quentes do dia quase ninguém se aventurou a sair de casa, pelo menos aqui pelos arredores do bairro onde moro. Ao olhar as ruas vazias, lembrei-me dos dias de jogo do Brasil em clima de Copa e também de Teresina. Na capital do sol e da luz, as pessoas se organizam para fazer as atividades fora de casa antes das dez da manhã ou depois das quatro da tarde. Neste intervalo quase todo mundo está enfiado em lugares fechados com ventiladores, climatizadores e aparelhos de ar condicionado. Além da sensação de calor, é impressionante a luminosidade do Piauí! Neste quesito faço justiça à cidade mais luminosa que conheci: Parnaíba, já às margens do menor litoral brasileiro.
            
Com licença poética de Lulu Santos, digo que a vida vem em ondas de calor. Além do aquecimento global, há que se considerar o aquecimento municipal e o pessoal. Sim, no âmbito dos grandes núcleos urbanos, está comprovado desde meados de 80, pela geógrafa Magda Lombardo, a formação da ilha de calor na metrópole paulistana. Já os calores da menopausa da minha cumadre, o desequilíbrio hormonal da minha outra cumadre e  os meus suores de pânico, possibilitam-me inferir de que há também um aquecimento na escala individual. Estamos todos febris: o planeta, as cidades e cada um de nós.
            
Acontece que ao largo de Teresina correm dois grandes rios: o Poti e o Parnaíba. Às margens deste último me refresquei tomando cajuína bem gelada com meu compadre Raimundo, arboricultor de primeira linha na cidade. Nós dois em outra situação, em Maringá, fizemos uma caminhada de horas pelas calçadas de alguns bairros para sentir e registrar a arborização do lugar. Lembro-me do aconchegante abrigo da luz do sol e da radiação solar ao transitar sob as copas contínuas de frondosos cedros, ipês, sibipirunas, paus-ferro e alecrins. Pra quem não sabe, Maringá é tida como exemplo a ser seguido no Brasil em termos de arborização urbana.
            
Aqui em Ribeirão já temos vários prédios e condomínios com nomes de árvores. E ao Rio Pardo temos dado as costas.

“Existirmos: a que será que destina?/Pois quando tu me deste a rosa pequenina/ Vi que és um homem lindo e que se acaso a sina/ Do menino infeliz não se nos ilumina/ Tampouco turva-se a lágrima nordestina/ Apenas a matéria vida era tão fina/ E éramos olharmo-nos intacta retina/ A cajuína, cristalina em Teresina” (Caetano Veloso).

Perci Guzzo é Ecólogo e Mestre em Geociências e Meio Ambiente.
Publicado na Gazeta de Ribeirão: 03/02/2011
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Edna Costa. Tecnologia do Blogger.